segunda-feira, 16 de março de 2015

O Fotógrafo de Lefrèvre, Guibert e Lemercier



O Fotógrafo é uma HQ baseada no relato e nas fotos de Didier Lefrévre sobre sua primeira viagem ao Afeganistão acompanhando uma missão do Médico sem Fronteiras (MSF). O ano é 1986 e o contexto é o do conflito entre o exército do governo comunista, impulsionado pelos russos, e a resistência Mudjahidin.

A HQ tem uma proposta muito interessante: combina as fotos de Lefrévre com quadrinhos para contar a sua história e, ao mesmo tempo, mostrar a realidade do povo afegão.

Acompanhamos todo o envolvimento do fotógrafo desde a sua chegada ao Paquistão (onde ele se junta aos médicos e outros profissionais do MSF), a trajetória de cruzar clandestinamente a fronteira para entrar do Afeganistão, a instalação do posto de atendimento dos médicos, a missão propriamente dita e o atendimento e contato com os afegãos; até o retorno de Lefrévre para o Paquistão e, posteriormente, para a França.

O texto foi adaptado de um livro de memórias do fotógrafo no qual ele conta, na verdade, todas as nove viagens que fez ao Afeganistão. Gostei muito do trabalho de transformação dessa obra em quadrinhos e fiquei super interessada em ler o livro autobiográfico do Lefrévre.

A combinação de fotos com o texto e os desenhos ficou muito incrível: Guibert e Lemercier fizeram bonito na edição. E as fotos são  belíssimas.  Em especial, o dualismo cromático das fotos em preto e branco e dos quadrinhos com tons terrosos fortes e um azul pálido ficou ótimo!



Posso dizer que apenas duas coisas eu não gostei nesta edição: a primeira é a divisão da HQ em três volumes fininhos que achei desnecessária. Merecia uma edição em um volume só e em capa dura. A outra é algo que não é exatamente um problema da edição: o número de fotos que aparecem muito pequenas. Dá para perceber claramente que são os negativos dos filmes reais e que a intenção é mostrar também todo o trabalho das fotos; mas fica muito pequeno em alguns momentos e não dá para apreciar tanto, na minha opinião.

As belas fotos de Lefrévre são, certamente, o grande charme da HQ. Nelas podemos ver o olhar que ele vai assumindo sobre a experiência e o seu amor crescente pelo Afeganistão: que se relaciona com o seu povo, com as paisagens e também com as enormes dificuldades vividas (pelo povo afegão e também pelo próprio fotógrafo; num certo sentido a HQ conta sua própria história de descoberta, de dor e superação).


Em vários momentos, Lefrévre fala de quanto algumas pessoas acabaram sendo muito impactantes para ele e de sua relação com elas; que era de admiração, muitas vezes, mas também de raiva, confusão e desespero.

Além disso, a HQ acaba mostrando um pouco também a relação entre os afegãos e seus líderes. Nas imagens à direita está Najmudin, um dos afegãos que mais impressiona o fotógrafo e com o qual este manterá sempre contato. As imagens mostram como Najmudin é bonito e forte; ao longo do texto vamos conhecendo sua influência no grupo e sua integridade.

Uma das coisas que mais gostei ao ler essa HQ foi também conhecer o trabalho impressionante do MSF; Lefrévre explora bastante como era a vida destes médicos que se dedicaram mais de uma vez a ir para contextos extremamente perigosos com o único intuito de servir e praticar a medicina. Também fala do relacionamento entre os médicos e a população, entre ele e os demais integrantes da missão (em sua maioria médicos) e nos conta suas histórias de vida.



Por fim, o sofrimento dos mais indefesos (as crianças e os mais velhos) é retratado também de forma muito bela e delicada.

Uma HQ que merece ser lida e divulgada, sem dúvida!


domingo, 15 de março de 2015

Parceria com a Rádio Londres!

Este é um post rápido para compartilhar uma alegria: a Rádio Londres, editora que abriu as portas tem muito pouco tempo em terras nacionais, é a mais nova parceira deste blog!

Conheci a editora através deste post dos espanadores e logo entrei em um frenesi ao saber da publicação de Stoner. Quem acomapanha o canal sabe que vi a indicação deste livro aqui nas melhores leituras do ano da Inês e fiquei com muita vontade de ler. 

Logo que vi o catálogo da Rádio Londres fiquei impressionada de querer ler praticamente todos os livros que a editora iria lançar. Inicialmente comprei Stoner e A vida em Espiral.

O primeiro é de John Williams, foi publicado em 1965 e esquecido durante muito tempo. Mas teve um revival há alguns anos e desde 2012 tornou-se um best-seller mundial. A vida em Espiral é do escritor senegalês Abasse Ndione, tem como personagem central um taxista traficante de maconha e foi publicado em 1985. Como amante de literatura africana, fiquei muito empolgada ao saber que este livro é lendário em Dakar. De modo geral a editora promete trazer bons livros de literatura estrangeira contemporânea; livros que fazem sucesso sim, mas em certos nichos mais cults e europeus e norte-americanos que não são publicados por aqui.


Por enquanto, só li Stoner e AMEI! Na época não consegui fazer um vídeo para falar dessa leitura, pois o livro mexeu MUITO comigo. Stoner é um professor universitário que estudou e trabalhou toda sua vida na Universidade do Missouri. É um homem comum, simples, que não teve nenhum reconhecimento especial na universidade, sendo apenas lembrado vagamente pelos colegas (fato que tomamos conhecimento na primeira página do livro). O enredo não faz nada além de contar toda sua vida. Falando assim parece simples e estranho todo esse frisson em torno da obra de Williams; mas o modo como esta obra foi escrita, o Stoner que acabamos por conhecer e a simbiose entre escrita e personagem é belíssima. Além disso o livro toca em algumas questões que certamente nos tocam fundo e de uma maneira mais existencial. Assim estão as questões da vocação, da dedicação profissional, do amor e das decepções nestes dois campos da vida, bem como na própria razão de ser da universidade e no seu funcionamento (este ponto certamente interessará mais a quem também vive neste meio, como eu). Enfim, ainda vai sair um vídeo lá no canal sobre esta leitura; quando sair atualizo este post.

No mais só queria dizer que estou bem feliz de ter sido selecionada para ser parceira da editora, pois tenho muito interesse em várias obras que a Rádio Londres já lançou e as que estão por vir. ; )

Para conhecer mais esta editora sugiro o vídeo dos Espanadores e o  face da RL: facebook.com/radiolondreseditores.


quinta-feira, 5 de março de 2015

Leituras de janeiro


(Post absolutamente atrasado, mas a vida é assim. Como tenho o objetivo de deixar aqui registradas impressões de leitura para o futuro, vou publicar os resumo de janeiro assim super tarde mesmo e, a partir de agora, sempre falarei das leituras do mês anterior no início do mês - corrente -).

Janeiro foi um mês meio molengo (por conta do imenso calor! e das minhas férias), mas consegui me dedicar à leitura e foi um ótimo começo do ano literariamente falando.

1. Suíte em quatro movimentos da Ali Smith

Queria conhecer a autora e também queria um livro diferente para estrear o Kindle Voyage que comprei na minha viagem ao Chile no final do ano passado. Esse livro da Ali Smith estava em promoção na amazon e foi assim que juntei a fome com a vontade de conhecer a escrita da autora.

Gostei bastante; quatro estrelas. Agora quero ler o Hotel Mundo. 

2. AMOK - Beneth

Livro que traz tirinhas com um humor mórbido que tem como personagem principal Amok: um menino que tem vontade de comer o cérebro ou o coração das pessoas com molho pesto. Como não amar?

Dei três estrelas e meia, mas foi só porque achei que algumas questões tratadas ficam repetitivas (ou porque sou chata e não tenho sensibilidade para tirinhas?).

3. A noite da encruzilhada - Simenon

Devoro tudo que é do Simenon; com este não foi diferente. A trama é simples, mas este tem personagens que eu gostei muito e tem também um clima de tensão que se mantém até o final da história. Maigret cada vez mais se tornando um dos meus detetives favoritos da vida!

Falei destes três primeiros livros do ano aqui.

4. Tête-a-Tête da Hazel Rowley

Biografia da relação sui generis de Simone de Beauvoir e Sartre: AMEI! 5 estrelas e daqueles para reler no futuro. Hazel Rowley consegue fazer um livro que tem ao mesmo tempo uma narrativa fluida e profunda e questionadora em vários momentos. A edição tem fotos belíssimas de Simone e uma coisa que eu gostei muito foi a inclusão de trechos de diversas obras de Simone e Sartre nos momentos certos, bem como explicações das questões filosóficas e políticas bem feitas e claras. É um excelente trabalho de pesquisa e escrita: muitas palmas para a Hazel!
Criei o #ProjetoBiografias por conta dessa leitura. Tem vídeo aqui e aqui para falar desse projeto amor!

5. Duas Vidas: Gertrude e Alice da Janet Malcolm

Engatando firme no mundo das biografias, li em seguida este livro curto da Malcolm sobre alguns aspectos da vida de Gertrude Stein e de Alice B. Toklas. O livro é divido em três partes e todas ficam meio inacabadas, abertas. A autora começa se perguntando como Gertrude e Alice deixaram seu judaísmo incógnito no decorrer de suas vidas e como sobreviveram na França ocupada. O ponto central é como isso não aparece nas obras autobiográficas que Gertrude publicou. Em um segundo momento, Malcolm empreende uma investigação sobre The making of Americans e seu lugar como obra literária na vida de Gertrude; essa foi a parte que eu achei mais interessante. Ao longo do livro, Malcolm discute as possibilidades de uma biografia, as dificuldades de conhecer questões mais profundas da vida das pessoas sem, de alguma forma, que o afeto ou a forma da pesquisa interfiram nesse processo. Porém, não achei que ela conseguiu ser muito feliz neste livro em específico ao tratar destas questões.

6. Middlesex - Jeffrey Eugenides

Fiz um vídeo sobre este livro fantástico do Eugenides. Personagens inesquecíveis: Cal, Desdêmona e Esquerdinha! < 3

7. Uma Rua de Roma - Patrick Modiano

Meu primeiro contato com o autor ganhador do Nobel de Literatura no ano passado (e sim, foi por isso que quis conhecê-lo). Confesso que o livro me intrigou, mas não de forma definitiva. Dei quatro estrelas pois ele é muito bom em alguns aspectos. O mais interessante é o clima todo da obra que tem um personagem desmemoriado em busca de sua identidade como mote para falar também de uma sociedade que se encontra em um processo de reconstrução, por um lado, e de esquecimento e memória, por outro (a França da década de 60). 


E também li metade de David Copperfield, esse livro incrível que eu amei perdidamente! (e que vai aparecer no resumo de fevereiro. ;)